"A Origem da Obra de Arte", Martin Heidegger

Introdução

   Martin Heidegger, filósofo alemão, nasceu a 26 de setembro de 1889 e faleceu a 26 de maio de 1976. Estudou teologia e filosofia na Universidade de Freiburg e foi professor na Universidade de Marburgo. A 1 de maio de 1933 inscreveu-se no partido nazista, e envolveu-se amorosamente com a sua aluna judia Hannah Arendt, que se tornou também uma poderosa filósofa do século XX. 





A sua essência

   A obra em estudo inicia-se com uma problemática: o conceito de origem.

   A palavra origem provém em latim de origo e remete para a ideia de essência e existência. Perguntar pela origem de algo é perguntar pela sua essência visto que, se eliminar algo essencial numa coisa, essa coisa deixa de o ser. Por exemplo, se retirar o racional ao Homem, este deixa de ser Homem porque perde a sua principal existência. 
   Como está expresso no livro, "Origem significa aqui aquilo a partir do qual e através do qual uma coisa é o que é, e como é. Ao que uma coisa é como é chamamos a sua essência. A origem de algo é a proveniência da sua essência."




   Ao observar esta publicidade podemos afirmar que está a apelar à compra de garrafas de Coca Cola, apresentando o formato do produto em venda e um slogan apelativo à marca. Porém, ao retirar o produto presente, estaria o anúncio a apelar a compra de algo? Aqui está o exemplo:




   Ao retirar a figura do produto em venda, também se está a eliminar a essência da publicidade em causa! Sem a apresentação da figura, apenas se observa um slogan que pode defender imensas marcas e produtos, não apresentando o principal objetivo e função deste anúncio em causa. 
   "A pergunta pela origem da obra de arte indaga a sua proveniência essencial."


O círculo Arte/Obra/Artista

   Esta poderá ser uma das perguntas mais complicadas de obter uma única resposta: o que veio primeiro, a arte, a obra ou o artista? É uma das perguntas com a maior variedade de respostas.
   Na minha opinião, o que esteve e está na base de tudo é a arte! Sem uma noção de arte, não existiriam obras nem artistas. O próprio nome artista deriva da palavra arte, sendo aquele que imagina e cria. Por sua vez, não haveria nada no qual poderíamos chamar de obra de arte, se não estivesse presente, mesmo inconscientemente, a ideia de arte. Desta forma, considero que a arte é a origem de tudo o que se seguiu. O artista ao criar algo/uma obra tem obrigatoriamente presente a noção de que por trás de tudo aquilo existe algo superior, a arte.
   Depois de tentar responder a esta questão, interrogo-me: o que é a arte? Estará esta presente em tudo, ou seja, a arte tudo é? 
   O nome arte derivada do latim ars e defini-se como intuição, expressão ou projeção e considero que a arte está presente em tudo! Será uma cadeira uma arte? Sim, é uma arte! E assim o é porque foi formulada uma ideia e a partir dela criou-se algo com uma determinada função, propósito e de certa forma com um símbolo. 

   Porém, com um estudo mais detalhado da obra A Origem da Obra de Arte cheguei à conclusão que a arte, a obra e o artista completam-se e desta forma não se pode assegurar a existência primária de algum deles. 
   Sem arte não existiriam artistas nem obras (como já referi); sem artista não existiram obras porque não seriam construídas, e muito menos a ideia de arte; e sem obras de arte não existiriam artistas para as criar ou a própria arte. "Tão necessariamente quanto o artista é a origem da obra de arte (...) a obra é a origem do artista (...) a arte é, ainda de um outro modo, a origem ao mesmo tempo do artista e da obra."
   Desta forma, estes três conceitos criam uma estrutura circulante entre si, completando-se e resultando simultaneamente.


                              
                                                                                   https://www.youtube.com/watch?v=l1vnsqbnAkk



   Tendo como referência este anúncio publicitário da Barbie, procuro confirmar a afirmação anteriormente referida. 
   De facto, este anúncio não existiria se a relação obra/arte/artista não estivesse em constante cumplicidade. Esta obra é origem do artista e da arte, tal como o artista é origem da arte e da obra, e como a arte é origem da obra e do artista. 
   Este anúncio publicitário é, com todas as certezas, uma obra de arte! Transmite uma mensagem importantíssima ao mencionar que as crianças ao brincarem, podem ser tudo o que quiserem! Com apenas a sua imaginação podem transportar-se para uma outra realidade e para um outro mundo onde tudo é possível e onde todos os seus desejos ou sonhos se tornam reais. Porém, com este anúncio transmitem a ideia que este "transporte" pode ter como auxílio uma boneca Barbie que torna a situação mais divertida e realista. 
   Concluindo, o artista colocou a sua ideia num suporte (obra) e através dele, não só pretende vender um produto, como quer associa-lo a uma mensagem positiva sobre o alcance de sonhos. Estes três conceitos uniram-se e criaram esta magnifica e inspiradora obra de arte, que não seria possível se não houvesse uma estrutura circulante entre estes.

  
1ª Via de investigação (COISA-OBRA)

Caráter coisal da coisa

   A descoberta do enigma desta obra começa com a explicação do significado de coisa, que nos irá guiar ao conceito de obra de arte. Por isso, o que é uma coisa?
   "A pedra no caminho é uma coisa, tal como o outeiro no campo. O cântaro é uma coisa, tal como a fonte no caminho. E o que se passa com o leite no cântaro e com a água da fonte? Também elas são coisas se, com razão, se chama coisas à nuvem no céu e ao cardo no campo, à folha no vento de Outono e ao açor no bosque.", ou seja, a coisa é tudo o que seja inanimado e no qual o sujeito tem consciência da sua existência.
   Ao questionarmos sobre o conceito de origem de arte, interrogamos-nos simultaneamente sobre o caráter coisal da coisa, visto que "(...) a obra de arte também é uma coisa, na medida em que é, em geral, algo que é." 
   Como irei referir mais à frente, a coisa encontra-se na obra de arte, na medida em que qualquer obra necessita de um suporte; de uma matéria que contenha o conteúdo. Porém, no momento em que o conteúdo da obra de arte seja totalmente revelado, este torna-se numa mera coisa.

Matéria e forma

   Já abordei certas características sobre a obra de arte em si, como  sua origem, o seu carácter coisal ou o próprio círculo arte-obra-artista. Porém, não poderíamos falar de nada disso se a própria obra de arte não existisse, ou seja, se não houvesse uma materialização da ideia. "O carácter coisal na obra é manifestamente a matéria de que consta. A matéria é o suporte e o campo para a enformação artística." 
   É neste sentido que surgem os conceitos de matéria e forma. A matéria (irracional) é que faz uma coisa ser coisa, é o suporte; enquanto que a forma (racional) é a idealização do que se pretende passar para a matéria. Por exemplo, um determinado artista idealiza a figura de Jesus, sendo esta a forma, e materializa-a numa escultura de mármore (a matéria). Desta forma, o desaparecimento inconsciente da matéria remete-nos para outro mundo - para a obra de arte -, aonde encaramos a matéria não como uma coisa, mas como uma passagem para outra realidade.
   Por outro lado, o que estará em primeiro lugar? A matéria ou forma?  Na realidade, não há uma resposta definitiva a esta questão, visto que essa posição depende unicamente do ponto de vista do artista ou do fruidor. O artista parte da forma para a matéria, em detrimento do público que passa da matéria para a forma.



   Tendo por base esta estratégia de marketing da bebida energética Red Bull pretendo justificar o que referi anteriormente.
   Do ponto de vista do artista, este partiu da ideia de divulgar uma determinada marca e só depois materializou-a num carro; enquanto que o fruidor visualiza primeiro o carro com a marca e o produto referenciado, e só depois parte para a ideia de fazer publicidade a essa determinada marca.


Alegoria e símbolo

   "Nas quadras que a gente vê,
   Quase sempre o mais bonito
   Está guardado pr'a quem lê 
   O que lá não 'stá escrito."

Este Livro Que Vos Deixo..., António Aleixo


   Tal como nesta quadra está referenciado, as obras de arte não são só aquilo que aparentam ser... há sempre muito mais do que aquilo que é visível, sendo esta a magia contida nas obras de arte! "A obra de arte é, com efeito, uma coisa, uma coisa fabricada, mas ela diz ainda algo de diferente do que a simples coisa é, (...) A obra dá publicamente a conhecer outra coisa, revela-nos outra coisa; ela é alegoria. À coisa fabricada reúne-se ainda, na obra de arte, algo de outro. (...) A obra é símbolo." Uma obra de arte só pode ser assim considerada se transmitir uma mensagem, se de alguma maneira consegue fazer o fruidor refletir. A obra de arte é como um jogo, visto que capta a atenção por ser um "mistério sem solução" em que é impossível descobrir toda a sua realidade. Porém se toda a mensagem de uma obra de arte for revelada, esta deixará de ser considerada uma obra de arte.


Jogo entre mim e a obra 
         |
Descobrir o que a obra vai transmitindo
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É inabitual
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Causa: 
  • Espanto;
  • Admiração.
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Momento de tensão
             |
Na obra de arte não se consegue captar totalmente a mensagem, algo que a diferencia de uma obra que não é arte.






   Parece uma simples fotografia de um menino a mostrar a sua mão suja, mas será apenas isso? Esta imagem apela para algo que não é totalmente visível; transmite-nos um sentimento de angústia e de tristeza ao ver uma criança com um ar tão infeliz e cansado. Na realidade, esta imagem é um anúncio publicitário que apela para a defesa das crianças que são usadas como escravas em trabalhos árduos. São crianças abusadas que perderam toda a sua liberdade e infância ao serem submetidas a trabalhos de escravatura.


Habitual

   Na obra em estudo o habitual é referido como algo vulgar e natural e quando algo rompe com o habitual, essa situação pode ser considerada estranha. "O que nos parece natural é unicamente o habitual do há muito adquirido, que fez esquecer o inabitual, donde provém. Este inabitual, todavia, surpreendeu um dia o homem como algo de estranho, e levou o pensamento ao espanto."
   E o que é o habitual? Algo que pertence à realidade e que provém de um pré-conceito, ou seja, de um juízo pré-concebido. Ao ouvir o barulho de uma fechadura, associamos o abrir ou fechar de uma porta, fazendo da própria realidade preconceituosa.
   Desta forma, pretendo romper o habitual com esta imagem:


  
  Ao observar esta imagem associei-a, de imediato, a uma publicidade de super heróis, talvez de jogos ou filmes, mas ao procurar a verdadeira origem desta imagem, fiquei sinceramente espantada. Descobri que realmente pertencia a uma publicidade mas não sobre jogos, bandas desenhadas ou filmes quando li o slogan que este anúncio defendia:




   Este slogan modificou todas as ideias que tinha em mente sobre esta publicidade. Para além de concordar que está perfeitamente idealizada e executada ao referir que nem os super-heróis são imunes a esta doença, nunca pensaria que estaria a apelar à defesa do cancro da mama. 
   Concluindo, todo o ser humano é preconceituoso visto que irá sempre associar algo a uma ideia pré-concebida pelo mesmo, influenciando a forma de ver as situações do quotidiano e o próprio mundo. Porém, o que poderemos fazer para avaliar uma situação sem ter uma ideia previamente concebida sobre algo? "Será possível, e como, evitar tal ataque? Só o conseguiremos se deixarmos à coisa como que um campo livre, a fim de que possa manifestar directamente o seu carácter coisal. (...) Para ouvir um mero ruído, temos de deixar as coisas, afastar o ouvido de as ouvir, isto é, ouvir abstractamente."
   Sim, é possível! Primeiramente, precisamos "limpar" da nossa mente tudo aquilo que pode influenciar a maneira como vemos as coisas. Por exemplo, ao observar a imagem anteriormente referida, não deveríamos especular sobre qual seria a sua intenção ou o que poderia transmitir, mas sim observá-la e apreciá-la sem fazer juízos de valor, de forma a que não a considerássemos inabitual ou estranha. O ser-estranho é apenas um ponto de vista... 



O apetrecho

   No desenrolar da leitura da obra em estudo, encontrei um conceito totalmente novo que completou o meu conceito de obra de arte: "Na medida em que o apetrecho ocupa uma posição intermédia entre a mera coisa e a obra é natural conceber também, com ajuda do ser apetrecho (do complexo matéria-forma), o ente que não tem o carácter de apetrecho, as coisas e obras e, finalmente, todo o ente."
   Desta forma, o apetrecho e a obra de arte estabelecem uma relação, na medida em que o apetrecho "ocupa uma posição intermédia entre a mera coisa" e a obra de arte.  Tem um papel de auxílio, tendo uma função e um determinado uso. Porém, o apetrecho deixa de o ser quando perde a sua função ficando reduzido apenas como uma coisa. 
   



   Nesta publicidade da marca Lipton, a função do apetrecho é vender o produto mencionado, apresentando a caixa e um copo com o mesmo produto. Porém, este apetrecho auxilia esta publicidade a ser uma obra de arte, ao transmitir sensações de frescura, relaxamento e leveza. 
   Este copo de chá é um mero copo de chá, mas no ambiente claro e luminoso onde se encontra o copo e a embalagem, "fita-nos" a descontração e tranquilidade de quem consumir este produto, fazendo com que os consumidores associem esses sentimentos ao chá Lipton. Todavia, no momento em que este apetrecho deixe de guiar o público a essas sensações de bem estar e leveza, este perde as suas funções e fica reduzido a um mero objeto, a um mero copo de chá.


O Belo 

   O que poderemos considerar belo nas obras de arte?  Uma obra de arte não pode ser considerada bela por seguir as regras de beleza, mas sim por produzir a própria beleza. "Nas belas artes não é a arte que é bela, chama-se assim porque produzem o belo. A verdade, pelo contrário, pertence à lógica. A beleza está reservada à estética."





   
   Para concluir tal afirmação, selecionei três publicidades da marca de roupa H&M, cada uma delas com uma modelo com as suas próprias características corporais. Através destas três imagens apresentadas, poderemos afirmar que o conceito de beleza existe e que há alguma mais bela que a outra? 
   O conceito de beleza encontra-se devidamente apresentado, mostrando a figura de três mulheres que transmitem essa mesma beleza porém de diferentes maneiras. Por outro lado, não posso afirmar que existe uma mais bela que a outra visto que todas transmitem um diferente tipo de belo, não melhor ou pior que outro... apenas diferente. Infelizmente, nem todos pensam assim...
   O corpo é, para a sociologia, uma representação social, na medida que para além de variar consoante os tempos e as sociedades, influencia a maneira de agir, pensar e sentir dos indivíduos. Dessa forma, as próprias sociedades criam ideais de beleza que os elementos dessas mesmas sociedades procuram alcançar. Para tal, o encontro e definição de beleza nestas três fotografias pode variar imenso, consoante a comunidade e horizonte hermenêutico dos indivíduos que a avaliem. 
   

2ª Via de investigação (OBRA-VERDADE)
   

Funcionalização da obra de arte

   "Assim, as próprias obras encontram-se e estão penduras nas coleções e nas exposições. Mas estarão elas porventuraaqui em si próprias, como as obras que elas mesmas são, ou não estarão antes aqui como objetos do funcionamento das coisas do mundo da arte? As obras tornam-se acessíveis à fruição artística pública e privada. As autoridades oficiais tomam a cargo o cuidado e a conservação das obras." 
   Neste contexto, até que ponto é que as obras de arte permanecem nelas próprias e não são funcionalizadas por nós? A arte desprendesse de si mesma, na medida em que permite ao fruidor a sua descoberta, criando como um jogo em que chama a atenção por ser um "mistério sem solução", e obriga o público a tentar descobrir sempre um pouco mais da realidade que integra (aspeto intencional da obra de arte). É neste sentido que surge o horizonte hermenêutico, visto que cada indivíduo interpreta as diversas obras de arte conforme as suas experiências/vivências e tendo por base os preconceitos da sua própria realidade.
   Concluindo, a verdade nasce da dialetica (da contradição), em que há uma constante tentativa de descoberta do que está escondido.



   
   "O comércio de arte zela pelo mercado. A investigação em história de arte transforma as obras em objetos de uma ciência." Dessa forma, ao instalar uma obra numa exposição, é lhe conferido dignidade, consagrando-a como obra de arte.
   Neste prédio apresentado, provavelmente da empresa desta marca de tintas, funcionalizou a sua obra de arte: a publicidade. Esta funcionalização permitiu que os seus potenciais compradores tivessem a perceção das características do produto em venda. Não só associam ao produto, como o encaram como divertido e diferente de todas as outras marcas de tinta.


Ocultação/Dissimulação

   A que propósito surgem estes dois conceitos na obra em estudo? Primeiramente, o conceito de ocultação remete-nos para aquilo que está escondido, e o conceito de dissimulação para o engano; surgindo como a própria realidade da obra de arte. 
   Podemos assim afirmar que a obra de arte oculta e dissimula a própria realidade, na medida em que não a revela totalmente. Se tal acontecesse, se todos os símbolos e alegorias fossem revelados, a obra de arte deixaria de o ser, ficando apenas como uma coisa. Como já referi, é nestes conceitos que se baseia o jogo entre artista e fruidor, levando ao constante interesse de descoberta daquilo que abrange a obra de arte. "Um edifício, um templo grego, não imita nada. Está ali, simplesmente erguido nos vales entre os rochedos. O edifício encerra a forma do deus e nesta ocultação deixa-a assomar através do pórtico para o recinto sagrado. Graças ao templo, o deus advém no templo. Este advento de deus é em si mesmo um estender-se e o desmarcar-se do recinto como sagrado."

                        
 

   A alegoria ocultada e dissimulada neste anúncio da instituição APAV remete-nos para uma realidade de dor e sofrimento que não se encontram totalmente representadas. Neste simples vídeo somos transmitidos para um outro mundo repleto de dor e tristezas, provocando-nos um sentimento de impotência face a estes problemas que, infelizmente, são muito regulares. Por outro lado, incentiva-nos a acabar com a maldade presente no mundo, "cortando" com tudo aquilo que nos causa dor e transtorno.



Instalação dum Mundo

   Esta instalação dum mundo não se refere ao sentido literal da palavra de erguer ou erigir, mas no sentido de transporte e abertura a um horizonte hermenêutico. Dessa forma, relacionando com a funcionalização da obra de arte, a exposição da obra é um erigir de um mundo. " Como é que da obra resulta a exigência de uma tal instalação? Porque ela própria, no seu ser obra, é instaladora. O que é que a obra enquanto obra instala? Levantando-se em si mesma, a obra abre um mundo e mantêm-no numa permanência que domina." 
   E que mundo é que a obra instala? "Mundo não é a simples reunião das coisas existentes, contáveis ou incontáveis, conhecidas ou desconhecidas. Mas o mundo também não é uma moldura meramente imaginada. O mundo mundifica e é algo mais do que o palpável e apreensível." Ou seja, esta instalação dum Mundo, remete-nos para uma outra realidade! A obra de arte abre-nos um novo mundo de constante descobertas e aventuras em que o que é observado transmite-nos muito mais do que é apenas visível!

   
Com este anúncio somos transportados para uma triste e cruel realidade em que a morte de animais exóticos é justificada para a venda de produtos. Através do erigir desta obra de arte, instalou-se um mundo de injustiça e maldade.

Paralelamente, este anúncio transmite-nos um outro mundo! Um mundo de luta e de vontade de vencer, em que somos encorajados a perseguir os nossos desejos e sonhos por mais difíceis que possam parecer!


   Concluindo, cada obra de arte tem a sua própria intenção na instalação dum mundo. Isto tal acontece porque cada obra de arte tem as suas alegorias, símbolos e funções. Esta é a magia das obras de arte! Podem ter o mesmo conceito, porém cada uma delas tem a sua especialidade, alterando constantemente o que pretendem que chegue ao fruidor!


O Combate

   Na obra em estudo surgem dois conceitos opostos que se completam: a terra e o mundo. "Mundo e terra são essencialmente diferentes um do outro e, todavia, inseparáveis. O mundo funda-se na terra e a terra irrompe através do mundo." A terra refere-se à coisa, ao suporte, à materialização da obra , onde a obra está edificada e o que suporta o mundo; em detrimento do mundo que se refere às emoções, ao transporte para outra realidade. 
   "O ser-obra da obra consiste no disputar do combate entre mundo e terra." Não se associa este combate à destruição ou discórdia, mas sim à elevação e auto-afirmação das suas essências. A terra eleva-se do mero suporte e permite ao fruidor a descoberta de um outro mundo/realidade. Este combate faz com que as obras de artes sejam obras de arte, superando a mera coisa. Porém, no momento em que este combate termina (toda a verdade foi embarcada), a obra de arte, sendo terra e mundo, transforma-se numa simples coisa.




   Com base neste anúncio, o cartaz é a terra e a realidade de liberdade, aventura, coragem e felicidade para onde somos transportados, é o mundo. Existe um combate entre estes dois conceitos visto que através da terra instalou-se um mundo, e este mundo só poderia ser descoberto que estivesse contido na terra.


3ª Via de investigação (VERDADE-ARTE)

Inserção da Verdade na Obra

   A obra de arte não é uma cópia da realidade, mas sim a manifestação da própria verdade. Desta forma, diferencia-se de outras obras porque procura ir mais além das coisas e porque revela a verdade, a realidade. "A realidade da obra determina-se a partir do que na obra está em obra, a partir do acontecer da verdade."
   Com efeito, ao desvendar a verdade manifestada nas obras de arte, abre-se um novo mundo "ainda não decidido e imenso e abre, assim, a necessidade oculta da medida e decisão." É neste sentido que se formula uma diferença entre as proposições enunciativas (afirmamos que algo está certo, porque acreditamos que tal é assim) e a própria obra de arte. A revelação da realidade faz-se através das obras de arte e não daquilo que consideramos que é certo. Por exemplo, templos, quadros ou publicidades revelam a verdade porque são manifestações de arte , tendo antes de tudo o resto, o conceito de Arte abrangido.  

   De que forma a verdade é manifestada nas publicidades? Estas obras de arte revelam as suas verdades não só através de imagens, como de slogans que nos transportam para uma outra realidade, seja ela qual for. Uma simples publicidade tem o poder de nos elevar para um outro mundo onde somos capazes de descobrir a essência do seu ser.

   Desta forma, qual é a origem da obra de arte? A origem da obra de arte é a própria arte visto que vai revelando a própria verdade e se vai tornando histórica (ganha uma nova configuração) na medida em que as obras de artes mantêm-se obras de arte porque alguém as salvaguardou!


Caráter terrestre

   O carácter terrestre é compreendido, nesta obra, como um suporte. "A obra advém como algo em que a verdade está.", ou seja, o suporte/terra de uma obra de arte contém a própria realidade/verdade. Na medida em que cada obra de arte tem um determinado e único suporte, este por sua vez também demonstra uma realidade específica: "Na terra, como o que essencialmente se fecha sobre si, encontra, todavia,a abertura do aberto a sua resistência."
   
   Relativamente ao suporte das obras de arte, estes podem ser considerados finitos e infinitos. Tendo por base esta publicidade, o suporte finito é o camião, ou seja, é onde está exposto a obra de arte; enquanto que o suporte infinito é o conteúdo desta publicidade que nos transporta para novas realidades.
  
Essência da arte (A Linguagem e a Poesia)

   O conceito de linguagem surge pela primeira vez na obra como uma forma de comunicação e entendimento: "Não transporta apenas em palavras e frases o patente e o latente visado como tal, mas a linguagem é o que primeiro traz ao aberto o ente enquanto ente."  A linguagem poderá ser considerada uma obra de arte na medida em que para além de permitir o entendimento entre as mais diversas sociedades, unindo-as, tem o poder de mover e influenciar mentes.





   Paralelamente, é através deste conceito que surge a Poesia, a forma prioritária em que a Arte se mostra; é a ilustração da verdade através da linguagem. "A própria linguagem é Poesia em sentido essencial. Mas, porque a linguagem é o acontecimento em que, para o homem, o ente como ente se abre, a poesia, a Poesia em sentido estrito, é a Poesia mais original, no sentido do essencial. A linguagem não é, por isso, Poesia, por ser poesia primordial, mas a poesia acontece na linguagem, porque esta guarda a essência original da Poesia." 


Conclusão: Origem da obra de arte


   De forma a terminar a minha análise desta obra em estudo, pretendo responder com a questão que ronda toda a obra: qual é a origem da obra de arte?
   Como já referi, a origem é a própria arte! "A arte é o pôr-em-obra-da-verdade." A arte faz com que a verdade se ergue. Desta forma, a arte é na sua essência, uma origem, visto que torna a própria verdade histórica. A arte é histórica na medida em que funda a História e proporciona a construção de um povo. Todavia, esta origem da obra de arte só existe devido aos que criam e aos que salvaguardam através da observação, analise e interesse as próprias obras de arte. 


"Dificilmente,
  O que habita perto da origem abandona o Lugar."

  A Migração IV, 167. 

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